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Foto do escritorLeonardo José da Rocha

A força e os desafios do magistério


Celeste: “Os problemas sociais não tornaram a sala de aula um problema.”


Entrevista especial


No mês de outubro comemora-se o “Dia do Professor”, data em que se pode refletir sobre os avanços, os retrocessos, os entraves, as frustrações, mas especialmente sobre a grandeza e importância desta verdadeira missão de vida. Com 24 anos de profissão, em Oliveira, a professora Celeste Maria Canhestro de Almeida Sardinha, formada em magistério e história, com pós-graduação em psicopedagogia, gestão, supervisão e inspeção, fala à GAZETA DE MINAS sobre a sala de aula; uso de tecnologias e do celular pelos alunos; missão da família na educação; remuneração profissional e sobre outras importantes questões que envolvem o aprendizado.


Gazeta - Por que você decidiu ser professora?

Celeste - Era um sonho desde criança. Quando me perguntavam, eu dizia: quero ser professora ou veterinária. Mas a vida me colocou em outro lugar, que era um Escritório de Contabilidade. Meu sonho ainda estava comigo. Certo dia tomei uma decisão: vou estudar para ser professora. Assim corri atrás e me formei no Magistério. Depois fiz faculdade de História. Sempre admirei esta profissão. É muito digna, muito honrada e ser professora de história me tornaria uma pessoa mais politizada, mais envolvida com a formação da sociedade. Porque é necessário conhecermos o passado, para não repetirmos os mesmos erros no futuro. E assim eu me formei, me realizei, e sou muito feliz nesta profissão.


Gazeta – Com todas as questões sociais, econômicas e familiares que envolvem a juventude atual, a sala de aula se tornou, hoje, um problema grave?

Celeste - Não acho que a sala de aula seja um problema, apesar das conjunturas e das situações sociais pelas quais passamos. É o contrário. Acho que é uma solução. Sem a sala de aula, não teríamos nenhuma esperança para melhorar a humanidade e tornar a sociedade mais justa e menos desigual. Os problemas sociais não tornaram a sala de aula um grave problema, e sim um desafio constante e difícil, mas que temos de enfrentar e transformar.


Gazeta – Como você avalia o atual nível de atenção e aprendizado dos alunos?

Celeste - O conceito de aprendizado mudou ao longo dos anos. O que nós compreendíamos como aprendizado, quando éramos estudantes, não é o mesmo conceito que se tem hoje no século XXI. Porque se levarmos em conta as teoria das inteligências múltiplas, todos são capazes de aprender em diferentes momentos. Cada indivíduo tem a sua hora, seu momento, sua aceleração ou não na questão da aprendizagem. Há várias inteligências: visual, inteligência científica, inteligência sonora. Então a questão do aprendizado é muito diversificada em um mundo repleto de informações.


Gazeta – O uso do celular por alunos na sala de aula é um entrave para o verdadeiro aprendizado?

Celeste - Não acho que seja um entrave. Eu enxergo como uma solução, sendo necessário redimensionar a questão do material pedagógico. As escolas devem usar suas verbas para conectividade, com materiais tecnológicos novos, modernos, que surgiram ao longo dos anos. A questão de quadro negro e giz já está um pouco ultrapassada. Temos de modernizar e evoluir. Com as novas tecnologias é necessário que o professor também acompanhe essa evolução, tornando o processo de aprendizado mais interessante para o aluno.


Gazeta – Até onde e como o avanço tecnológico e a inteligência artificial podem ajudar professores e alunos?

Celeste - A Inteligência Artificial pode nos ajudar e é necessário repensar as políticas pedagógicas para um futuro próximo. Os gestores e os fomentadores da educação devem buscar verbas e conhecimentos, visto que a inteligência artificial é uma questão que não podemos ignorar. A inteligência artificial deixou de ser uma realidade distante e restrita à ficção científica e está cada dia mais presente em nossas vidas. É difícil ter uma definição única para a inteligência artificial pelo fato de ser um campo multidisciplinar e em constantes atualizações. É necessário que haja uma interação com esta questão proposta. E ela já é uma tendência no mercado de trabalho, E logicamente interfere positivamente na educação, ajuda os estudantes a encontrar recursos relevantes para pesquisas, aulas online, informações virtuais e até um melhor desempenho escolar.


Gazeta – Como as famílias podem auxiliar no aprendizado dos jovens?

Celeste - Não existe uma receita pronta para a família auxiliar e ajudar, porque cada aluno tem suas dificuldades. E cada família também tem seus saberes, suas particularidades e limitações. Deve ser levada em consideração a questão das limitações e dos saberes individuais de cada família. Mas é necessário e dever da família ajudar a escola na educação e no aprendizado de seu filho. Essa parceria é essencial para o desenvolvimento do educando. Quando a escola não tem essa parceria, há uma queda no aprendizado.


Gazeta – O professor é, realmente, um profissional mal remunerado?

Celeste - Se considerarmos a dedicação da maioria dos professores, realmente a profissão é mal remunerada. Existem excelentes professores, mas a maioria tem que se desdobrar para ter um salário digno. Alguns chegam a trabalhar em três turnos, e com certeza isso prejudica a educação e também o desempenho profissional. Essa semana saiu um resultado de pesquisa que, entre todas as profissões que exigem o terceiro grau, a da Educação é a pior em remuneração. E se analisarmos o fracasso da educação atualmente no Brasil, este fator da remuneração interfere, com certeza, no resultado negativo dos índices.


Gazeta – A seu ver, os professores têm buscado sempre seu aprimoramento técnico-profissional?

Celeste - Na minha visão existem professores que realmente se preocupam em buscar novas práticas e iniciativas para se aprimorarem. No entanto, isso nao é uma regra geral. Regra geral não existe, ainda mais ratando-se de uma profissão tão diversa como a de professores. Muitos são empenhados, buscam aprimorar sua prática pedagógica e se modernizar. Outros nem tanto.


Gazeta – O analfabetismo funcional é visto, hoje, como um dos maiores problemas do ensino brasileiro. Como você, como professora, enxerga esta realidade?

Celeste - A questão do analfabetismo funcional é muito complexa para dar uma resposta objetiva e curta. Ela merece uma atenção melhor. Mas sabemos que a principal causa do analfabetismo funcional apontada por especialistas em educação é a descontinuidade da aprendizagem, quando o baixo índice de escolaridade e a má qualidade do ensino impossibilitam o aprendizado e aperfeiçoamento das técnicas básicas da alfabetização. Nas escolas, já são aplicadas técnicas para amenizar esta situação, como incentivo à leitura e à escrita, técnicas de interpretação de textos e a exploração de temas alinhados à realidade dos estudantes, incluindo também a cultura digital. Esta situação é muito mais ampla do que se imagina e esta realidade reduz oportunidades de inclusão social e empregabilidade, principalmente entre os grupos que não são economicamente favorecidos.


Gazeta - Em vista de todas essas intercorrências, o que fazer para melhorar o ensino no Brasil?

Celeste - Políticas públicas mais eficientes e uma cobrança mais aguda da prática pedagógica. Qualquer política pública Educacional só terá chance de sucesso se os governos investirem na capacitação e valorização do profissional de educação; implantar a cultura digital na Rede Pública de ensino, garantindo a infraestrutura tecnológica; desenvolver as habilidades sócio-emocionais dos alunos; elaborar novas políticas e diretrizes pedagógicas para o uso das tecnologias educacionais que fomentam a interdisciplinaridade e o desenvolvimento de habilidades, para alcançar êxito nas competências preconizadas na BNCC, como conhecimento, pensamento crítico e criativo, cultura digital, comunicação. As escolas de formação de professores tinham de ser repensadas e atentar mais a estágios na questão da formação profissional. É um assunto importante, que merece debates e urgentes medidas saneadoras.

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